Com expressões como “vamo botar fogo em tudo”; “o Estado vai pagar cada lágrima sofrida que eu vim a derramar” e “queimar tudo, tocar o terror”, músicas alusivas às ações da facção Sindicato do Crime do RN (SDC-RN) são alvo de investigação da Polícia Civil. As músicas, segundo a Polícia, foram compostas por um MC de Natal e trazem apologia aos ataques ocorridos no mês de março, com citação a nomes de pelo menos 180 pessoas identificadas pela Polícia como faccionados e lideranças criminosas de bairros de Natal e de várias cidades do RN. Segundo a Polícia, o investigado teria recebido R$ 2.000 por pelo menos três músicas em 2023, bem como pagamentos para citação de nomes dos criminosos na canção.
A investigação da PCRN faz parte de um inquérito instaurado desde março pela Divisão Especializada no Combate ao Crime Organizado (Deicor), que apura crimes do SDC-RN. Na última segunda-feira (24), a Deicor cumpriu um mandado de busca e apreensão na casa de Alison Firmo de Melo, 23 anos, com apreensão de um celular e um computador que serão investigados pela Polícia. O homem não apresentou defesa com advogados no momento do depoimento.
Segundo as investigações, o MC é responsável por compor e cantar músicas que citam as facções Sindicato do Crime do RN (SDC-RN) e Okaida, da Paraíba. Nas canções, na perspectiva da Polícia, ele faz apologia ao crime e exalta as atuações dos faccionados durante os atos criminosos registrados no Estado durante o mês de março. Além disso, o cantor cita em suas composições os apelidos dos líderes da organização criminosa e em cada bairro/cidade do RN.
“Conseguimos identificar que havia um canal no Youtube que fazia essa divulgação de músicas com alusão e exaltação desses criminosos e dos crimes que eles praticavam, fazendo ainda a citação das lideranças de cada cidade do Estado e de cada bairro de Natal. A partir disso, foram quase 200 nomes das lideranças da facção e representamos pela busca e apreensão na casa desse compositor que era o responsável por fazer essa exaltação da facção”, informa à TRIBUNA DO NORTE o delegado Pablo Beltrão, da Deicor.
O delegado da Deicor informou que o investigado negou ser integrante da facção, sendo uma espécie de prestador de serviços. “As investigações vão se aprofundar para saber se esse MC tem alguma ligação que não seja só de produzir as músicas e exaltar a facção. Ele pode responder por apologia ao crime/criminoso, previsto no Código Penal. Temos que aprofundar para saber se tem essa ligação. Ele negou, mas caso tenha, pode responder por integrar organização criminosa”, disse.
As músicas estão postadas em vários canais no Youtube e são replicadas por outras contas relacionadas, gerando engajamento e uma série de comentários nas publicações. “Parabéns família sdc do RN PÔR MAÍS UM ANO DE ATITUDE DISPOSIÇÃO E RESPEITO, que venha mais ano dessa família sdc rn”, diz um comentário. Em outro trecho, uma conta publicou “RJ e RN conexão, Família CV e SDC é nós”, cita.
O delegado Pablo Beltrão disse que, no depoimento, o MC admitiu que já compôs outras canções em anos anteriores, incluindo uma música para a facção Comando Vermelho (CV) do Rio de Janeiro.
“No ano passado ele fez uma canção em comemoração aos nove anos do SDC-RN, fez músicas comemorativas da Okaida, da Paraíba. O que nos interessa agora é identificar esses nomes citados como sendo liderança de cada cidade do RN”, cita.
Faccionados pagam por citações, diz a Deicor
As investigações da Polícia Civil do Rio Grande do Norte têm identificado que faccionados do SDC estariam pagando valores ao cantor e compositor para serem citados e exaltados nas músicas. As quantias pagas têm valores que variam de R$ 30 a R$ 120.
As músicas são facilmente encontradas em uma busca simples na plataforma de compartilhamento de vídeos do Youtube. Uma das músicas, intitulada “SINDICATO DO RN - A REVOLTA DOS CRIA, O ESTADO É NOSSO!!”, há referências à reportagens, citações e registro das demandas dos faccionados nos ataques do mês de março. Uma das estrofes, por exemplo, refere-se às demandas dos presos como motivações para os ataques.
“Contra a opressão, tortura sofrimento/ dentro do Sistema Carcerário faz tempo/ nós não aguenta mais tanta humilhação/ só quer tirar cadeia em paz, pega a visão/ dez anos a família tá comemorando, lá em 2013 nós foi se organizando/ pra chegar nesse momento deixar tudo palmeado/ passando o pente fino, pra dominar o Estado/ mas tá tudo bagunçado, dentro das cadeias/ nunca mais vimos sol, bate uma forte tristeza/ mas eu sou o Sindicato, nordestino na veia/, mas não é nada legal viver sendo espancado/ vários passa mal por causa do lixo do Estado/ que não as condição e não respeita as visita <sic>”, diz uma das músicas.
“Essas pessoas fizeram pagamentos para ele para incluir os nomes nas canções. A partir das movimentações bancárias, as análises e conversas, será possível identificar e punir esses criminosos”, acrescenta Pablo Beltrão. “Com a apreensão desses aparelhos, vamos desencadear outras operações, com identificação, qualificação e responsabilização dessas lideranças da facção”, cita.